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Em nota, Conselho Indigenista Missionário denuncia violência contra os Yanomami

03 de maio de 2022


Imagem de destroços da aldeia após incêndio que está sendo investigado. Foto: Mídia Ninja


Após denúncia de estupro cometido por garimpeiros a uma criança de 12 anos em comunidade indígena em Roraima, a aldeia foi incendiada e mais de 20 Yanomami estão desaparecidos. Em nota, Cimi Regional Norte I denuncia aumento de violência contra os Yanomami, se solidariza e cobra medidas de proteção aos indígenas e seu território. Confira


Abraçamos o povo Yanomami em sua dor e angústia


Por CIMI Regional Norte I


O ar brasileiro está ficando rarefeito! Está difícil respirar em um país que sufoca, maltrata, negligencia, incita à violência e assassina sua população com uma política que, abertamente, quer o extermínio dos povos indígenas.


São inúmeros os casos, situações e acontecimentos provocados pelo avanço do garimpo sobre as terras indígenas do Amazonas e Roraima, seja em terras Munduruku, dos povos do Vale do Javari, em terras às margens dos rios Jutaí e Japurá no médio Solimões ou nas terras do povo Yanomami. A cada dia que passa, cenários mais aterrorizantes se apresentam nesses e em outros territórios dos povos originários.


Nos últimos dias, o mundo assistiu a mais uma extrema situação de desumanidade, consequente da política genocida assumida pelo Governo Federal.


Lideranças do povo Yanomami denunciaram a morte de uma menina de 12 anos após ser estuprada pelos garimpeiros que tomaram conta da comunidade Aracaçá, região de Waikás, e o desaparecimento de outra criança de três anos, quando a tia das meninas resistiu à violência.


As organizações indígenas, apoiadas por organizações indigenistas, pela Diocese de Roraima, pela Pastoral Indigenista e pelas congregações de religiosos e religiosas, bem como a Procuradoria Geral da República (PGR) em Roraima, vêm, nos últimos anos, denunciando o aumento assustador de garimpeiros na Terra Indígena Yanomami (TIY): mais de 20 mil garimpeiros e pessoas que dão suporte à atividade ilegal circulam nas terras e rios, intimidando, ameaçando, avançando, desmatando, poluindo, contagiando, violentando e matando.


O Relatório “Yanomami sob Ataque. Garimpo Ilegal na Terra Indígena Yanomami e Propostas para Combatê-lo”, das organizações Hutukara Associação Yanomami (HAY) e a Associação Wanasseduume Ye’kwana, resultado de estudos e mapeamentos, registros fotográficos e infográficos, indica que, de 2016 a 2020, o garimpo na região cresceu nada menos que 3.350%. Em 2021, o garimpo ilegal avançou 46% em comparação com 2020, revela o estudo.


O aumento expressivo do garimpo na Terra Indígena Yanomami aumentou a frequência e a intensidade das ameaças à vida dos povos Yanomami e Ye’kuana. O ano de 2021 foi extremamente trágico para o povo Yanomami, principalmente a partir do mês de maio, com ataques violentos à comunidade Palimiu, na região do rio Uraricoera, e que se estendeu depois a outros lugares. Em 2022, novos relatos denunciaram o fornecimento de armas de fogo aos indígenas, que começam a se confrontar, gerando conflitos internos. Houve mortes em um destes confrontos entre as comunidades Tirei e a de Pixanehabi.


A livre circulação, pelas florestas, rios e nas comunidades dentro da TIY, de homens a serviço do garimpo, fortemente armados, gera insegurança a quem se opõe ao garimpo, inibindo os indígenas de circularem livremente pelo território e impedindo a normalidade das atividades diárias de auto sustentação e até de visitação entre comunidades.


Os impactos socioambientais decorrentes da invasão garimpeira se multiplicam, comprometendo o acesso ao ambiente adequado, à alimentação saudável e à água potável.


A contaminação das águas por mercúrio, diretamente associada ao garimpo, causa danos irreversíveis à saúde.


Estudos conduzidos em 2014 pela Fundação Oswaldo Cruz, a pedido das comunidades, constatou que na comunidade de Aracaça, os 92% dos indígenas apresentaram índices elevadíssimos de mercúrio no sangue. Além disso, o relatório da Hutukara Associação Yanomami (HAY) mostra que “há notícias de maior incidência de doenças neurológicas entre recém-nascidos nas comunidades Yanomami, mas estas não passaram por diagnóstico de contaminação de mercúrio, apesar de haver orientação normativa nesse sentido”.


As pistas comunitárias que deveriam atender às equipes de saúde estão ocupadas para operação e abastecimento do garimpo, postos de saúde completamente abandonados, situações de desvio de medicamentos e vacinas destinadas aos indígenas para atendimento de garimpeiros.


Os documentos também apontam que o garimpo é responsável pela desestruturação, aliciamento e abuso sexual nas imediações das comunidades indígenas, o que mostra que o recente crime cometido contra a menina Yanomami não é um caso isolado. Em 2020, já se teve registros de crimes de violência e abuso sexual e mortes cometidos por garimpeiros de outras meninas Yanomami. Depois desses episódios, outras situações foram denunciadas.


A última denúncia feita pelo Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Ye’kwana (Condisi YY), em 29 de abril de 2022, foi o sequestro de um indígena Yanomami recém nascido levado para a cidade por um garimpeiro que alegou ser seu filho.


Apesar de tantas denúncias e de tantos crimes, mesmo com sucessivas decisões judiciais proferidas em diversas instâncias do Poder Judiciário brasileiro desde 2018 e da adoção de Medidas Cautelares por parte da Comissão Interamericana de Direitos Humanos em 2020, todas elas obrigando a União a atuar na proteção e monitoramento da TI Yanomami, incluindo a retirada dos garimpeiros e o controle do suporte logístico e empresarial da atividade ilegal, o Estado brasileiro persiste na omissão e na realização de operações pontuais claramente ineficientes.


Diante desse terrível cenário que vem se estendendo há anos, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) manifesta, em primeiro lugar, sua profunda dor e máxima solidariedade ao povo Yanomami por mais esse triste acontecimento que chega ao conhecimento de todo o mundo. Abraçamos os Yanomami em sua dor e angústia e reafirmamos nossa parceria com a Hutukara Associação Yanomami (HAY) e ao Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Ye’kwana (Condisi-YY) e seu conselheiro Júnior Hekurari Yanomami.


Com urgência, o Cimi pede a adoção de medidas de proteção ao povo Yanomami e ao seu território. Que não seja mais protelado o desenvolvimento e a retomada de estratégias de Proteção Territorial consistentes, capazes de deflagrar operações regulares de desmantelamento dos focos de garimpo e a manutenção das Bases de Proteção Etnoambientais nos locais estratégicos; operações de extrusão e repressão à atividades ilegais nas zonas atualmente impactadas mediante a inutilização das pistas de pouso clandestinas e as aeronaves apreendidas; recuperação dos postos de saúde e pistas de voo comunitárias que, hoje, se encontram sob controle dos garimpeiros; destruição total dos maquinários utilizados na extração de ouro com o objetivo de impedir a rápida retomada da exploração, atuando rotineiramente, adaptando as áreas prioritárias com base em informações atualizadas sobre o avanço da atividade nas diferentes regiões da TIY, e impedindo a rápida rearticulação dos focos de garimpo desmantelados para, assim, descapitalizar os empresários que fomentam o crime no território Yanomami; e a concretização de outras medidas apresentadas no relatório da Hutukara Associação Yanomami (HAY).


Por fim, fazemos nossas as palavras de Dom Mário Antônio da Silva, novo Arcebispo da Arquidiocese de Cuiabá, que em sua Homilia despedida de Roraima, no dia 24 de abril de 2022, denuncia “a omissão e a responsabilidade do Governo Federal que, ao invés de cumprir seu papel constitucional na defesa dos povos indígenas e de suas terras, patrimônio da União, incentiva as invasões e coloca na pauta do Congresso Nacional o projeto de lei que legaliza a mineração em terras indígenas. Tal proposta não passa de uma ilusão enganadora de supostos benefícios. Sofrem os povos indígenas, a natureza, os ribeirinhos e as cidades com os rios e os peixes envenenados pelo mercúrio, e sofrem também as pessoas iludidas que buscam no garimpo um modo de escapar das duras condições de vida no Brasil, mas encontram servidão, violência, drogas e morte. Deus nos livre dessa maldição!”


Fonte: CIMI



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